Estudos epidemiológicos sugerem que a prevalência de SAOS em doentes hipertensos varia de 22% a 62%
Estudos recentes sugerem uma forte relação entre a síndrome de
apneia obstrutiva do sono (SAOS) e as doenças cardiovasculares, sendo
estas complicações da SAOS não tratada.
O
risco de mortalidade por doenças cardiovasculares nestes doentes,
quando não tratados, é muito elevado, mesmo nas situações em que outros
fatores de risco para as doenças cardiovasculares estão controlados,
como por exemplo, o tabagismo, as dislipidémias, o colesterol elevado, a
pressão arterial alta e a obesidade.
A
SAOS consiste numa doença respiratória caracterizada por colapsos
intermitentes e repetidos das vias aéreas superiores, durante o sono,
que resulta numa respiração irregular e micro-despertares frequentes
durante a noite, em que na maior parte das vezes os doentes não estão
conscientes destes despertares.
Os
eventos obstrutivos provocam pausas respiratórias (apneias) durante o
sono, com uma duração superior a 10 segundos e que se podem repetir mais
de 5 vezes por hora. Essas pausas originam uma diminuição acentuada do
oxigénio e também o aumento do dióxido de carbono no sangue.
Os
eventos obstrutivos e a consequente diminuição do oxigénio no sangue
estão relacionados com vários mecanismos fisiopatológicos que podem
estar na génese das doenças cardiovasculares, nomeadamente: a ativação
aumentada do sistema nervoso simpático, a variação acentuada da
frequência cardíaca, a libertação de substâncias vasoconstritoras, os
processos inflamatórios, o stress oxidativo, as alterações da função
endotelial, a resistência à insulina, as alterações da coagulação e as
variações da pressão dentro da cavidade torácica.
Estes
são os mecanismos que podem explicar as principais doenças
cardiovasculares mais frequentes nos doentes com SAOS: hipertensão
arterial (HTA), doença arterial coronária (DAC), acidente vascular
cerebral (AVC), insuficiência cardíaca e arritmias cardíacas.
Estudos
epidemiológicos sugerem que a prevalência de SAOS em doentes
hipertensos varia de 22% a 62% e que a prevalência da hipertensão
arterial em doentes com SAOS é de 40% a 90%. As apneias obstrutivas
durante o sono provocam alterações na pressão arterial, muitas vezes com
aumentos acima dos 30 mmHg da pressão arterial média.
Relativamente
à doença arterial coronária, um estudo prospectivo realizado em 2011 no
Hospital Distrital de Faro e publicado na Revista Portuguesa de
Pneumologia, em doentes que tinham sofrido uma síndrome coronária aguda
(SCA) revelou uma prevalência de SAOS de 43,1%. De destacar que em 48%
destes doentes, a sintomatologia do SCA iniciou-se no período entre as
22:00 e as 06:00 (período nocturno), sugerindo uma relação entre os
eventos obstrutivos da SAOS e o SCA.
Também
na doença cerebrovascular tem sido demonstrado que o acidente vascular
cerebral (AVC) e o acidente isquémico transitório são mais comuns nos
doentes com SAOS, comparativamente com a população em geral. A SAOS
relaciona-se com a HTA que, por sua vez, também apresenta uma forte
relação com o AVC.
As arritmias
cardíacas, principalmente as nocturnas, são frequentes em doentes com
SAOS, estando directamente relacionadas com o número de apneias e com a
gravidade da descida da saturação de oxigénio no sangue. Durante os
estudos do sono é possível observar uma variação da frequência cardíaca,
com uma bradicardia (ritmo lento) durante os eventos obstrutivos e uma
taquicardia (ritmo rápido) durante os microdespertares. As arritmias
mais comuns em doentes com SAOS são: sístoles prematuras ventriculares,
taquicardia ventricular não sustida, pausas sinusais e bloqueios
aurículo-ventriculares de 2º grau.
O tratamento eficaz da SAOS permite reduzir ou mesmo eliminar o risco destas doenças cardiovasculares.
Por João Tiago Pereira, Cardiopneumologista
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