Novos critérios para cirurgia abrem caminho para controle mais eficiente da glicemia em pacientes sem obesidade severa ou mórbida
Mudança vai atender pacientes diabéticos que não necessariamente têm obesidade, mas estão expostos ao risco de outras complicações no coração, nos rins e na retina
Hoje
indicada somente para obesos severos ou mórbidos, a cirurgia bariátrica
em breve será uma opção de tratamento para os diabéticos tipo 2 que já
não respondem aos remédios ou às injeções de insulina. Até o mês de
novembro, o Conselho Federal de Medicina (CFM) deve publicar novas
diretrizes para esse tipo de procedimento, garantindo o acesso de mais
pacientes aos benefícios metabólicos da redução de estômago.
Na
última semana, o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, pioneiro nos estudos
sobre o assunto no Brasil, realizou em São Paulo um encontro para
discutir as novas perspectivas em cirurgia para o controle da diabetes
tipo 2. Relator da diretriz no CFM, o Dr. Ricardo Cohen é quem está à
frente desse debate.
“Há
quatro anos estamos discutindo uma forma de indicar a cirurgia
bariátrica e metabólica para diabéticos não obesos mórbidos, mas as
pesquisas nesse sentido somam mais de uma década no País”, explicou o
médico. Atualmente, a redução de estômago só é realizada em indivíduos
com IMC acima de 35 kg/m² e que apresentem uma ou duas complicações
associadas (diabetes, hipertensão, apneia do sono, infertilidade e
outras).
Porém,
o Dr. Cohen aponta que grande parte dos diabéticos no Brasil e no mundo
não têm IMC alto. “O IMC da maioria dos diabéticos no Brasil é 29,8
kg/m², o que é considerado um sobrepeso, quase obesidade leve. Então
temos que ter alguma coisa para oferecer a esses pacientes quando o
tratamento clínico falha”.
A cirurgia
Na
prática, a cirurgia para o obeso mórbido e para o diabético é a mesma, a
chamada bypass ou Y de Roux: o médico reduz o estômago e desvia a
primeira porção do intestino em mais ou menos 50 cm. A diferença está
nos objetivos a serem alcançados em cada caso. “Vimos que a cirurgia
bariátrica não serve apenas para o indivíduo perder peso, isso é um
efeito colateral a longo prazo. O conceito de cirurgia metabólica nasce
daí, pois os resultados da redução de estômago sobre o controle da
glicemia são imediatos”, explica Cohen.
“Acreditamos
que há uma integração fisiológica entre tubo digestivo, pâncreas e
cérebro por trás disso”, destaca.De acordo com ele, a redução altera a
flora bacteriana intestinal, a secreção de ácidos biliares e modifica o
trânsito dos alimentos no intestino, promovendo tanto o controle do
apetite quanto o gasto calórico e a secreção de insulina.
Metabolismo
Segundo
o especialista, a nova diretriz pretende tirar do IMC o papel de único
critério para a indicação da cirurgia bariátrica. Pelo sistema discutido
no Conselho de Medicina, serão aplicadas notas a cada componente da
síndrome metabólica, como histórico familiar, idade, pressão e
colesterol, num total de 13 itens. Se o paciente cumprir sete deles,
será feita a indicação cirúrgica.
“É
bom lembrar que diabetes não tem cura, só remissão. Com a cirurgia, os
resultados são imediatos, independente da perda de peso. Em média, até
20% dos pacientes ao longo dos anos vai ter novamente a diabetes fora do
controle, mas a doença volta mais suave. Dos pacientes que usam
insulina, 90% ficam sem ela, então a qualidade de vida melhora
bastante”.
Efeitos
Entre
os possíveis efeitos colaterais a longo prazo estão deficiências
nutricionais leves, como de vitamina D, complexo A e B e ferro em
mulheres em fase sexual. “Mas é um tipo de cirurgia com baixo índice de
mortalidade, comparável a uma operação de vesícula”, completa o médico.
Ele
acredita que o Brasil, por estar no segundo lugar no ranking de
bariátricas realizadas no mundo – foram 96.500 em 2014 – está bem
servido de centros médicos preparados para atender a demanda que surgirá
a partir da publicação da nova diretriz. O procedimento para esse
perfil de pacientes, que custa hoje em torno de R$ 20 mil, a princípio
poderá ser feito apenas em clínicas particulares.
A
nova diretriz do Conselho Federal de Medicina conta com o apoio de
diversas entidades, como a Sociedade Brasileira de Cirurgia
Bariátrica e Metabólica e a Sociedade Brasileira de Diabetes.
IMC
O
Índice de Massa Corporal (IMC) é o padrão internacional para avaliar o
grau de sobrepeso e obesidade. É calculado dividindo o peso (em kg) pela
altura ao quadrado (em metros). IMC = Peso / Altura x Altura
< 16: Magreza grave
16 a < 17: Magreza moderada
17 a < 18,5: Magreza leve
18,5 a < 25: Saudável25 a < 30: Sobrepeso
30 a < 35: Obesidade grau
I35 a < 40: Obesidade grau II (severa)
>= 40: Obesidade grau III (mórbida)
Sobre Ricardo Cohen
Doutor em Medicina pela USP, atualmente é coordenador do Centro de Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Sua área de atuação é principalmente nos seguintes temas: diabetes mellitus tipo 2 e cirurgias bariátrica e metabólica. Foi apontado pela American Society for Metabolic and Bariatric Surgery como um dos 30 médicos mais influentes do mundo nesta área do conhecimento.
Doutor em Medicina pela USP, atualmente é coordenador do Centro de Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz. Sua área de atuação é principalmente nos seguintes temas: diabetes mellitus tipo 2 e cirurgias bariátrica e metabólica. Foi apontado pela American Society for Metabolic and Bariatric Surgery como um dos 30 médicos mais influentes do mundo nesta área do conhecimento.
* O repórter viajou a convite do Hospital Alemão Oswaldo Cruz
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